Ainda o rol da ANS
25 de agosto 2022 Paulo Araripe Jr.
Congresso vai encarecer os planos de saúde se deixar terapias e procedimentos a critério de juízes
Parlamentares são rápidos quando se trata de aprovar projetos que eles julgam capazes de lhes renderem dividendos eleitorais.
Em junho, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que o rol de procedimentos listados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para os planos privados é taxativo, não apenas indicativo. Em 13 de julho, deputados apresentaram texto que anula o entendimento do STJ, sacramentando em lei o caráter exemplificativo da lista.
Em 2 de agosto, foi requerida urgência para a tramitação do diploma, aprovado no dia seguinte em três comissões e no plenário da Câmara. Mais 24 horas e a propositura já estava no Senado, onde deve ser votada em breve.
Não deveria haver dúvida de que considerar o rol taxativo é a abordagem mais racional. Ela permite lidar melhor com dois problemas – efetividade e economicidade dos procedimentos e terapias.
Quando a lista do que está coberto pelo plano passa antes por uma comissão de especialistas, os charlatanismos mais acintosos tendem a ser eliminados. A pandemia mostrou que não são poucos os médicos dispostos a prescrever drogas sem nenhum amparo da ciência.
O projeto aprovado na Câmara até exige que os procedimentos a ser pagos pelos planos tenham amparo em evidências. Mas, como não oferece uma fórmula inquestionável para definir o que é científico ou não, fica ainda muito aquém de resolver o assunto.
O problema da economicidade é ainda mais complexo. É disseminada a ilusão de que, quando um paciente tem tratamento custeado pela operadora, o montante gasto sai dos lucros dos capitalistas. Na realidade, porém, é o conjunto de usuários que, com suas mensalidades, paga por todos os sinistros.
Isso significa que tudo aquilo que é incluído na cobertura deveria idealmente passar por uma análise de custo-benefício. Se o rol é taxativo, a decisão caberá a especialistas da ANS; se indicativo, caberá aos juízes, que raramente terão a formação adequada.
A judicialização do tema introduz ainda um elemento de iniquidade, já que são as famílias mais ricas que costumam recorrer à Justiça.
Se os parlamentares querem favorecer os usuários, o melhor seria criar regras para evitar que a lista da ANS fique congelada para reduzir os custos dos planos. Ela deve ser sempre atualizada, proporcionando a todos a melhor combinação de eficácia e custo.
Referência: Folha de São Paulo