Ameaça de judicialização
21 de setembro 2022 Paulo Araripe Jr.
Operadoras afirmam que vão recorrer à Justiça caso não seja vetado trecho da lei que obriga convênios médicos a cobrirem tratamentos avalizados por evidências científicas, mas não previstos no rol da ANS
Entidades do setor de saúde debatem estratégias para tentar derrubar parte do projeto de lei que modificou o rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), aprovado em agosto deste ano pelo Congresso Nacional. O presidente Jair Bolsonaro (PL) tem até a próxima segunda-feira para sancionar a matéria. Contudo, ainda há expectativa de veto parcial do texto tanto quanto de uma nova rodada de judicialização do tema, a exemplo do que ocorre na questão do piso da enfermagem.
Em junho deste ano, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que o rol da ANS deveria ser taxativo, ou seja, não exemplificativo. Por esse entendimento, os planos ficaram obrigados a cobrir apenas os tratamentos e procedimentos médicos definidos na lista da ANS. A decisão admitia exceções, uma vez que novos procedimentos são frequentemente solicitados pelos usuários que apresentam a documentação necessária para novos tratamentos — não previstos no rol obrigatório.
A decisão do tribunal, no entanto, gerou polêmica, e foi acusada de proteger as operadoras de saúde ao restringir o alcance das coberturas oferecidas ao consumidor pelos convênios médicos. Por conta disso, o senador Cezinha de Madureira (PSD-SP) apresentou o Projeto de Lei nº 2.033/2022, que derrubou o rol taxativo, com forte participação do relator da matéria na Casa, senador Romário (PL-RJ). Assim, em 22 de agosto, os parlamentares derrubaram a vinculação do atendimento à lista obrigatória, extinguindo o rol taxativo. De acordo com o projeto, os planos de saúde voltaram a ficar sujeitos a pagar tratamentos não especificados na lista da ANS, desde que avalizados por evidência científica que comprove sua eficácia.
Na expectativa da sanção presidencial, integrantes de entidades representativas dos planos de saúde dizem que a redação do texto deixa a interpretação aberta e agrava o quadro de insegurança jurídica no setor. A principal crítica é quanto ao inciso primeiro do texto, que libera a oferta de procedimentos com “comprovação da eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico”.
Reação
De acordo com o presidente da ANS, Paulo Rebello, o órgão iniciou processo interno preparando uma reação se o projeto de lei for sancionado com o trecho em questão. Há mobilização das entidades representativas do setor para que o presidente vete essa parte do projeto.
Caso não ocorra o veto, a ANS deverá propor que o dispositivo seja regulamentado por meio decreto presidencial. “Se for sancionado, vamos trabalhar em um decreto junto à Presidência da República para que a gente possa regulamentar o que seria uma medicina baseada em evidência”, explicou Rebello.
O tema foi discutido entre os participantes do 26º Congresso da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), que teve como tema “Ecossistemas, acesso e sustentabilidade na Saúde Suplementar”, realizado na última semana, em São Paulo. Renato Casarotti, presidente da entidade, disse que o projeto de lei mobiliza grupos empresariais.
“Não falar qual evidência científica traz uma insegurança imensa. Do jeito que está hoje vai cair no mesmo lugar de sempre. Já existem ações no STF que debatem o tema, mas não fazem referência a essa lei. Por isso, estamos debatendo, sim, a judicialização do projeto ou parte dele como alternativa”, afirmou.
Autor: Michelle Portela
Referência: Correio Braziliense