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‘Previdência privada 2.0’ promete retorno maior ao investidor

14 de novembro 2022 Paulo Araripe Jr.

Após flexibilização de regras, oferta de produtos cresceu no país. Há fundos para todos os níveis de risco, com incentivos fiscais a longo prazo

Na medida em que o mercado de capitais evolui, cresce também a quantidade de produtos disponíveis, sempre tentando se adaptar ao gosto e perfil dos investidores. Embora a indústria de fundos como um todo esteja aquecida, os de previdência vêm se destacando. O número de fundos da categoria saltou 79% de 2019 para 2022, contra 40% nos fundos multimercados, 68% nos fundos de ações e apenas 17% na renda fixa.

A indústria de previdência privada alcançou em setembro a marca de R$ 1,14 trilhão de patrimônio líquido, o dobro do registrado há cinco anos, segundo a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). A categoria representa hoje 20% de toda a alocação na indústria de fundos do Brasil.

Os fundos de previdência vêm se renovando e buscam reverter a má fama de produtos engessados que frequentemente perdem para a inflação. As adaptações para atender aos investidores cada vez mais exigentes ainda estão em curso, mas já se vê uma evolução.

Mudanças regulatórias permitiram o lançamento de fundos mais arrojados, com a possibilidade de gestão sofisticada em ativos diversos. A classe conseguiu se expandir para além da monotonia da renda fixa. Com a maior concorrência, as taxas de carregamento, entrada e saída, que tomavam os fundos de previdência privada pouco atraentes e minavam a rentabilidade, foram sendo reduzidas e, em muitos casos, eliminadas.

– A competitividade não é somente nas taxas. O fato de poder escolher mais opções melhora a composição da carteira previdenciária, possibilitando diversificação e adequação ao perfil de cada um – afirma Tiago Roque, diretor de Investimentos da Preves, fundo de pensão dos servidores do Espírito Santo.

Com a atualização das regras, os gestores ganharam mais flexibilidade para montar as carteiras. Por exemplo, antes havia muitas travas para alavancagem dos fundos (comprar ativos além dos 100% de patrimônio do fundo), além de um limite rígido na parcela investida no exterior e em ações. Ainda há uma camada de proteção para esses fundos, mas ela está mais maleável.

Agora é possível investir até 100% dos recursos em ações e 40% em ativos no exterior, nos fundos voltados a investidores qualificados (aqueles com mais de R$ 1 milhão). Para os investidores de varejo os limites são de até 20% para ativos no exterior e 70% em ações, no caso dos fundos de previdência.

BANCOS CORREM ATRÁS

Segundo o vice-presidente de Produtos da Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (FenaPrevi), Sandro Bonfim, as mudanças contribuíram para que casas e gestores independentes tivessem interesse em lançar fundos.

A assessora de investimento Luciana Ikedo ressalta que essa “previdência privada 2.0” permite replicar estratégias de fundos comuns:

– Você tem uma espécie de réplica daquele fundo na previdência. Dessa forma, os gestores podem utilizar a mesma estratégia, e o investidor pode se beneficiar bastante com as benesses fiscais dos fundos de previdência. Eles não têm come-cotas. A incidência de Imposto de Renda é somente no resgate. Isso tem muito impacto a longo prazo.

O come-cotas é o desconto de IR, realizado automaticamente a cada seis meses.

E quem investe a longo prazo tem um benefício extra, lembra a analista de fundos e previdência Luciana Seabra: o IR sobre o resgate pode chegar a 10% na tabela regressiva em aplicações acima de dez anos. Nos fundos tradicionais, a alíquota mínima é de 15%.

– De uns cinco anos pra cá, começaram a nascer fundos muito bons, com gestores independentes que perceberam que na previdência a tendência é ter menos resgate nos momentos de estresse. Então gestoras como SPX, Ibiúna e Verde aperfeiçoaram os produtos – diz Luciana Seabra.

O gestor da Ace Capital, Maiko Carvalho, cita ainda o estímulo da permissão para cobrar taxa de performance:

– Tenho incentivo para correr mais risco nessa classe de fundos e ser premiado quando conseguir bons resultados.

A taxa de performance só é cobrada sobre o valor que exceder a referência do fundo, o chamado benchmark. Por isso, se um fundo tem como referência o Certificado de Depósito Interbancário (CDI, que acompanha a Taxa Selic), o gestor ganha um percentual sobre tudo que render acima do CDI no período. Se a performance for apenas dentro do esperado ou abaixo disso, o gestor não recebe o extra.

Os grandes bancos acompanham a tendência e lançam produtos, para não perder espaço em uma indústria que só tende a crescer à medida que a população envelhece. Para o especialista de Portfólio da Santander Asset, Clayton Calixto, a reforma da Previdência, em 2019, também ajudou: – Adaptamos o portfólio a essa demanda nova do investidor em que ele busca mais risco e mais diversificação. E um mercado que tende a crescer muito, ele vai entender que vai cada vez mais precisar de uma poupança de aposentadoria.

Muitos investidores, no entanto, não conhecem esses novos fundos. Segundo Luciana Seabra, há bilhões alocados em fundos de baixíssima rentabilidade:

– Os maiores produtos de previdência brasileiros ainda são muito ruins. Rendem uma fatia do CDI há mais de dez anos. São caros perto do que fazem, sem qualquer sofisticação de gestão.

Autor: Isabel Filgueiras
Referência: O Globo