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Opinião

Afinal, o que é “economia dos seguros” e para que serve?

22 de maio 2023 Marcio Serôa de Araujo Coriolano

1 – Já ensinavam os filósofos clássicos – sejam os humanistas, os liberais e os de extração marxista – que é na economia onde acontece o mundo real. Na economia dos interesses de cada segmento dominante em cada momento histórico. No mundo da infraestrutura econômica. O mundo das leis nada mais faria do que plasmar os interesses de cada um desses momentos em códigos a serem obedecidos por todos os cidadãos.

2 – Com o progresso da humanidade as coisas nesses dois mundos não ficaram tão simples. Até porque muitas leis e regulamentos passaram a ditar novos modos de existência humana. Mas, de qualquer forma, o tal mundo da economia (para liberais, a alocação de recursos escassos; e para marxistas e neomarxistas a criação de valor no circuito capital/trabalho) permanece ditando a vida diária.

3 – Quando se fala em economia, é preciso separar os grandes agregados macroeconômicos dos chamados microeconômicos. O que são eles?

4 – Para tornar mais prática a minha abordagem, recorro aos seguros, objeto do meu interesse específico.

5 – Geralmente, aqueles que não tem maior intimidade com o tema pensam que a economia dos seguros estaria imediatamente associada à interpretação de demonstrativos financeiros e contábeis, movimentos de arrecadação de prêmios e pagamentos de sinistros, projeções do ambiente dos mercados e assim por diante.

6 – Ocorre que, na macroeconomia – ou mais propriamente na economia política (no sentido amplo, “nobre” do conceito de política) –, o desenvolvimento dos seguros depende crucialmente dos grandes agregados Produto-Renda-Emprego. Sabemos que os seguros (falo de todo o ambiente securitário: seguros gerais, previdência, seguros e planos de saúde e capitalização) são movidos pela capacidade de indivíduos, famílias e empresas “demandarem” (acessarem e pagarem) produtos e serviços. Para ser, de novo, mais prático, basta lembrar que, segundo a PNAD mais recente, quase 68% das famílias brasileiras auferem renda de até 2 (dois) salários-mínimos. Então, é disso que se trata quando se fala em “penetração” dos seguros no Brasil.

7 – Já na parte microeconômica, tão importante quanto, é onde acontece outro mundo real. Como todos os empresários e cidadãos são minimamente inteligentes e zelosos dos seus recursos, independentemente dos agregados macro buscam agir para manter hígidas as suas operações, selecionar os públicos que podem comprar, ampliar os públicos possíveis, escolher o melhor para si e transitar em um ambiente regulatório muito complexo e custoso.

8 – É nesse mundo micro onde todos se encontram verdadeiramente. Seja na concorrência no mercado, seja na sua capacidade de ampliar fatias do mercado, seja para tomar crédito e outras tantas providências a cargo de conselhos, comitês, enfim, o que chamamos de “governança”. E é onde os consumidores podem fazer as escolhas que caibam nos seus orçamentos.

9 – Há duas intercessões (pelo menos duas) entre esses dois mundos da economia dos seguros. Que me parecem particularíssimas. Uma, é o tão repetido, verdadeiramente, princípio do mutualismo. Dificílimo de explicar, e, mais do que isso, de obter a adesão de todos. Outra, é a das garantias dos riscos, ou provisões técnicas, que quase invisivelmente amparam os riscos contratados. Esta última não é tão particular, mas que sempre prevalece na prática.

10 – Da primeira intercessão – o mutualismo – deriva tudo o mais no mundo micro da economia dos seguros. Costumo dizer que fora da escala para diluição de riscos e da solidariedade, não há salvação.

11 – A segunda intercessão micro – a das garantias – tampouco é bem compreendida. Sempre me deparo com a indagação: – Para que tanto capital investido e guardado? – Deve ser coisa de capitalista que quer ganhar na ciranda financeira…

12 – Não bastassem essas particularidades, na economia dos seguros há atributos da operação que confundem mais ainda os neurônios de quem não tem intimidade com o assunto. São os submundos (no sentido nobre da coisa) da relação arrecadação/indenizações (a popular “sinistralidade”), a relação arrecadação/despesas da operação (para iniciados o anglicismo SG&A), a relação arrecadação/pagamento de comissões para intermediários. Ah! E o papel do resultado financeiro – linha obtida a partir do balanço entre créditos tomados e ganhos com os ativos constituídos.

13 – E apenas para concluir por ora, temos o mercado de capitais. O das companhias abertas. Um submundo (novamente em sentido nobre) bastante complexo, principalmente com a volatilidade característica dos nossos tempos. E que pauta também as companhias não abertas.

14 – Enfim, sabemos que isso tudo é assunto para quilômetros, e não metros. E talvez por falta de dedicação dos economistas, contadores, atuários, auditores, os mais habilitados a chamar a atenção para o mundo econômico dos seguros, são mais os advogados (com todo o respeito a eles) que atualmente empunham a bandeira da racionalidade dos fundamentos securitários.

Precisamos, os economistas e outros profissionais do campo econômico, nos juntar a eles, advogados, em benefício da melhor tradução e trânsito possíveis entre os mundos da infraestrutura real e o das leis e regulamentos.